"
É possível, por conseguinte, que um jornalista pratique um ilícito extremamente grave, com um muito elevado grau de culpa, e a esta conduta só possa aplicar-se a pena mais leve – a advertência registada – enquanto outro jornalista, tendo praticado uma infracção menos grave e com um grau de culpa substancialmente inferior, pode ser suspenso do exercício da actividade profissional. Ou seja, para efeitos de aplicação concreta das penas atribui-se um peso que não pode deixar de considerar-se excessivo à circunstância de o agente ter sido, nos três anos precedentes, objecto de outras sanções disciplinares. Tal representa uma clara limitação da competência, atribuída à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista, para decidir livremente e aplicar as sanções que tiver por adequadas em função das circunstâncias concretas dos casos submetidos à sua apreciação, ou seja, em função da gravidade da conduta e do grau de culpa do agente."
Este excerto, perfeitamente exemplar, da "
Mensagem do Presidente da República à Assembleia da República, a propósito do diploma que altera o Estatuto dos Jornalistas", diz quase tudo. A fundamentação de Cavaco é técnica e não política. Não está em causa a possibilidade de punir jornalistas e a alegada ofensiva contra a liberdade e o Estado de direito mas sim punir com mais eficácia e justiça. A razão deste trabalho extra da presidência da república de consultoria gratuita ao governo é explicado pelo próprio Presidente: "
o diploma ora sujeito a promulgação concitou em seu torno uma vasta controvérsia, seja entre os partidos com expressão parlamentar, seja entre a classe dos jornalistas e suas organizações representativas, seja, enfim, entre empresários da comunicação social, quando seria aconselhável que sobre o mesmo fosse alcançado um entendimento mínimo, atenta a sensibilidade da matéria em causa". Ou seja, houve demasiado ruído produzido por corporações de peso na sociedade portuguesa, o que só por si justifica a maçada de fazer com este diploma o que não fez com tantos outros que já promulgou, igualmente prenhes de incongruências técnicas.
Este Cavaco que apelou, do alto da sua maioria absoluta, "deixem-nos trabalhar!", não deixa de ser surpreendente. Mas é exactamente a mesma pessoa, com mais alguns anos de idade, que denunciava as "forças de bloqueio" que impediam o normal desenvolvimento da acção governativa. O patético da história, vertente sempre do meu agrado, são os cânticos de vitória com que nos embalam os opositores da lei. Será que leram a lei e a mensagem do Presidente da República? Ou serão apenas tontos?